quarta-feira, 27 de maio de 2015

Saber a sede




Diz-se o não se não se quer dizer
Sem sequer saber o que se dizer
Se assim o não que se diz não lhe seduz
Se tens a sede do dizer, não o dizes
Dizer o que não se sabe é querer se saber
Sempre que-sem querer-o saber te incomode
Não se acomode, o saber é dizer o dizer
Mas se alguém te disser que tudo sabes
Saiba que o não sempre foi o que me disses
De ser. De saber. De sabor. Sem saber a sede

terça-feira, 28 de abril de 2015

Distopia







O que aconteceu com a gente daqui?
Todo mundo está sempre tão distante
O céu não dura nem mais um instante
Está tudo tão diferente...(enlatado)
Se a verdade é a ponta do novelo?
Eu não invento o mundo
O mundo é apenas um grande apelo
Todos estão juntando as pontas
Desenrolando os nós (das gargantas)
E se perguntando se tudo ainda tem jeito
Eu não sou aquele que procura a resposta
Pois ainda estou buscando o conceito
O que será de nós?
A vida é um imenso vazio
Não mudo. Estou mudo. Do outro lado do rio
Percepção? Humanidade? Nada disso tem sentido
Sou apenas o fruto da loucura de um dia ter vivido
Daqui você pode ouvir algum som? É meu tempo acabando
Melhor ele já ir embora, pois os séculos só estão passando
"Nada do que é humano me é indiferente"
Pois era o que eu costumava ser
Indiferente








terça-feira, 14 de abril de 2015

Memórias de meus amores roubados-Parte Final









O amor é aquilo que não se pode conter. Talvez essa seja a maior virtude do amor. Talvez seja a sua maior fraqueza. Como conter aquilo que não se pode abraçar? Será que é sonhar demais? Todas essas perguntas passavam pela cabeça de Brian, enquanto ele avançava sem parar, em meio a uma frenética corrida por respostas. Ele sabia que era arriscar muito, mas aquele órgão em cima de sua caixa torácica saltitava inconstantemente, como se o desafiasse a provar que os ponteiros do relógio poderiam estar errados. Perdendo a respiração, chegou em meio à indicação do final do livro e viu com decepção o banco de madeira em frente ao sobrado abandonado. Somente um leve vento soprava em cima do banco carcomido pelos cupins. Devia admitir que aquele lugar era belo em outros tempos pelo modo delicado em que a fibra de madeira estava trabalhada, talhada e polida, ainda que coberta de poeira e fuligem. Deveria se sentir aliviado por não encontrar quem fizera perder o caminho até ali. Mas não estava. Todo o seu juízo tremia por respostas. Estava determinado a encontrar Louise, nem que para isso precisasse passar um longo tempo sentado. Não demorou muito para que uma menina andando passos largos chegasse e sentasse ao seu lado;
               -Espero que não se importe com meu amigo aqui-e deu um breve sorriso
               -Não, eu já estou acostumado com Mick. Somos iguais em muitas coisas- arriscou
               -Bem, você está pronto então?- disse Louise com uma cara séria
Não encontrei nada para responder, somente continuei encarando tentando esconder minha surpresa.
               -Pronto para que?- Louise falou o que estava pensando naquele exato momento
               -O amor, não é mesmo? Sempre ele-continuou
               - Parece que nada pode escapar do amor, nem ele mesmo! Como podemos entender uma virtude que ao mesmo tempo é vício? Os poetas falam de musas inspiradoras, os pintores de inspiração divina, outros mais conservadores chamam de motivo, mas todos em todos os lugares somente dão importância para os sentimentos físicos, você já se perguntou o porquê disso?- e me provocou
               - Você falou de parece, que vem do latim pareo que significa aquilo que aparenta ser. Arrisco-me a dizer que o amor é aparente- retruquei de imediato
               - Mick, pare de dizer que ele é dos seus!- virou irritada para dizer ao seu lado
               - Isso, o amor é como um vício aparente de sua própria personalidade. Lembra-se o que conversamos no primeiro debate? Somos aquilo que os outros moldam de nós. Não existe completude no amor!- disse mastigando palavras para soar dramática
               -Ela chama conversas de debates- aquilo simplesmente faíscou minha cabeça
               -Os sentimentos físicos são a importância imediata daquilo que consideramos. Sei que você vai dizer que não somos animais e que os desejos tem seu lugar de destaque na evolução. Ah, quem inventou essa história de que tudo o que pertence ao homem é evoluído?- e soltou a respiração
               -Mas o amor físico é uma consequência natural do ser humano, todos nós somos movidos por sensações inesperadas. O amor não decorre sempre de sensações químicas que se transformam em físicas!- rebati
               -Sei, sei!-disse em tom debochado- Os sentimentos são como fotografias, eles estão lá emoldurados, esperando para serem olhados e ativados, não é?
               -Não- interrompi- o amor não é de todo lógico, me recuso a acreditar que somos escravos de emoções. Porque assim elas se tornariam nossos deuses. Só viveríamos por elas e não por nós...mesmos!- não acreditava onde Louise havia me levado
               -Seja feliz. Compre esse jeans! Você não está vendo essa oportunidade? Vai perder a chance  da sua vida? Você é especial! Ame coisas supérfluas e seja igual a todo mundo quando tudo que você buscava era ser diferente, mas veja só... você já era diferente!- sua voz irônica era imbatível
               - Amar é ser egoísta buscando ser diferente mas sendo você mesmo!- soltou em voz baixa ajeitando os óculos.
               -Esse é o ponto em que o amor não pode escapar-continuou ela
               -Então o verdadeiro amor é egoísta?-provoquei.- Um sentimento venerado decorre de uma coisa que as pessoas não querem ouvir falar?-segui com o ponto
               -Sim, para cada chance que temos na vida, fazemos um destino novo: mudamos de casa, de emprego, de família...Mas quantas vezes você já viu alguém mudar de amar? O amor em si, é algo extremamente belo e essencialmente substancial- Louise sussurrou baixo como se aquela fosse a mais profunda das verdades
               -Eu preciso que as pessoas entendam- continuou em tom melódico- De todas as mais belas obras de arte, de toda a poesia e das coisas mais simples da vida, existem aquelas que você não consegue destruir, aqueles amores que fazem parte de você- e olhou para o vazio
               Depois de algum tempo em que continuávamos refletindo sobre amores roubados, entendemos que a memória daquilo que amamos era essencial para definir quem somos. Talvez eu nunca mais tenha visto aquela menina com armação e lentes grossas que teimava em ter argumentos para qualquer assunto.E não só isso. Mas de convence-lo de que aquilo era verdade. Talvez ela seja aquela mesma pessoa que encontro sentada todos os dias de quinta no banco dessa mesma praça. Ou talvez seja aquela mesma que interrompe pessoas na rua lhes perguntando sobre o amor. Talvez eles estejam ignorando a si mesmos quando dizem que tem pressa e não querem ouvir. Ou simplesmente vivem sem sentir, lembram o que não é para lembrar e falam sem amar. Talvez amar seja mesmo isso

Obs 1: Aprendi muito com Louise e essas memórias, fazendo delas todos os meus dias possíveis
Obs: 2: Mas não aprendi a amar diferente, apenas a adaptar o meu amor
Obs  3: Amor não se pode conter, vivemos apenas querendo apressar os ponteiros 
Obs 4: Respostas são a confirmação de que ainda existem perguntas que foram roubadas


Memória X: "O amor e as memórias são rit(m)os constantes, como o mar em relação ao horizonte, não podem ser separados e nem contidos pelo olhar"